SOLILÓQUIO ACRÍLICO E AZULADO
07:22:00
Sou atual, em forma gestos e ações... Atual por muito não saber o que dizer, e por não dizer escravizo ainda mais o pensamento.
Penso, sinto, retalho e retenho o que em folhas de pautas caligráficas trasbordam de minha existência.
Entre planos e contraplanos, desfoques e luzes amareladas, minha densidade é essa fala esquecida que na borda poética se insere, atravessado em dias evasivos da saudade escaldante que arde sem calor e sem o requinte da madrugada.
- Maldita inspiração caducada!
Agora que teu nome é liberdade, deu pra acordar na hora que bem quer, faz do labor um gesto desprendido, desprovido de valor monetário, e que me custa caro, esta insanidade irresponsável me somam angustias, que não somente assolam o peito, mas alvoroça ainda mais qualquer coisa que não sei dizer o nome. Faltam-me as palavras bem arranjadas, esteticamente sofisticadas, não sei dizer, simplesmente por falta de inspiração.
Tenho andado preocupado com essa autonomia monótona.
- Ave migratória dos diabos!
Esse tempo que passa e muda em constante nuance, a nudez que esqueci no varal de um latifúndio chamado amor. Preconizas não somente uma duas ou três horas de ensaios rústicos, mas me entravas na garganta o café amargo que desce até o fundo do estômago causando queimação, inquietações intermitentes como uma enxaqueca que se instala por semanas.
- Sou atual, não vede?
Atual em descrições silenciosas, cinematográficas, peças inéditas, teatrais, sou esse ensaísta das funduras repleto de intimidades. Um candeeiro apagado exalando querosene pelos cômodos acomodados da casa, no alpendre essa rede embalada pelo vento que sopra do norte, a página em branco depois do prefácio, meu barco meu pão, suor que escorre do rosto molhando os pelos do peito.
Na pausa da paisagem o que é vasto olhou pra dentro de mim e de solidão nunca mais morri. Nem mais ancorado, nem tão pouco fincado ao chão concreto de cimento, sou flecha atirada sem ter alvo certo. Justamente por ir em busca do desconhecido é que me lanço nesse labirinto da vida e deixo aqui estendido ao chão a couraça do cabra marcado pela vibrante fúria dos pseudos colegas acadêmicos que teimam em dividir tudo em dois lados, psicologizando tudo que encontram pela frente, reduzindo o ser a qualquer coisa desumanizada.
- Patéticos!
- Conheces primeiramente a ti mesmo e serão ainda mais poéticos.
Na falta latente do corpo, a ausência se materializa em presença e companhia para satisfazer o sofrimento da antimatéria.
Um mundo acrílico azulado visto de dentro da garrafa pet, a arte dos postais tormentam meus mitos, tua fala histérica, aparente fruta verde que queima o canto da boca do miúdo. Descascada fruta, tua pele, minha alegoria enfeitada de alegrias transitórias parada no asfalto esperando o sinal abrir, o brilho da bruma, o embaço do barco de fronte da lente sem reflexo.
O fogo apagado, a fumaça, o cheiro de querosene, a rede continua a balançar sem meu corpo repousado, guardei meus versos, o livro ficou sobre a mesa, do lado do copo vazio, escrevi meu primeiro nome, comum por aqui, e me mandei, debandei sem bandeira ostensiva, apenas segui, atual.
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