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ORFISMOS DE UMA ALMA EMBOTADA

15:47:00

Alma indigesta, indigna de sentir 
qualquer realidade minha que seja nua, 
indignação vomitada na calça desabotoada, 
embotada, escorrida pela calçada, 
procurando um pouco mais de cachaça dourada, 
maracujá maduro e um melaço de cana dormido.


Nas sobras de uma sombra e nas coxias do inferno
meu medo se despe sem desejo e calma, 
sem modos civilizados e sem cobertas, 
vestido do avesso desventurado, 
- porém gritante
esse grito é o que me cabe na boca, 
atordoando quem dorme, quem nasce, 
e quem apressadamente fugiu para fora de si.


Nada de silêncio ou organizações monogâmicas, 
o que cabe nesse orfismo indigesto 
são figuras indecifráveis, tuas inconstâncias, 
minhas incertezas, meus espasmos 
diante dos ignorantes sufocados por sonhos banais.


Flutuam as cinzas, farelos transbordam, 
vento e tempo passeiam vagarosamente,
fragmentos transpirados nas marquises, 
para-raios, pés calçados a correr, 
raízes deixadas pela estrada, 
escombros solitários semeados no caminho, 
um passado pisado, e tantas palavras 
que deixamos pra depois do depois.


Nada de beleza e riso, é tudo degradante 
em cada centímetro do teu rosto, 
do teu corpo despido e vigiado, 
e não tarda para alguém socorrer essa aurora livre, 
na certeza que também estou partindo, 
e que já é tarde demais para lamentar 
essa nossa estúpida mocidade.

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