MELANCOLIA SUJA NO PRATO

12:17:00

Quando acho que estou são, 
sem o torpor irresponsável 
de meu gesto dramático, 

quando imagino eu 
que estou limpo, sem o resto 
da melancolia suja no prato, 

quando de frente ao copo 
vazio, sem as gotas 
impávidas do álcool, 
de corpo sóbrio 

andando pelas ruas do centro,
equilibrado e sem tropeços 
mesmo com as pedras
frouxas no caminho, 

eis que o grito explode 
dentro de mim, 
ecoando e exalando 
pela garganta arranhada, 
desatada pelo velho nó, 

um gosto de sangue 
chega até a língua, 
à míngua, sem palavras 
poéticas, a sede que cede 

minha'alma que regurgita 
na tentativa ácida de escapar 
por entre os dentes 
um palavrão parafraseando 
o salto pra fora da boca, 

violentamente, como queira
ser deixado, com fome, 
sem erudição cabível e retornável
a esmo, aos mesmos diálogos 
patéticos sem profusão profissional

com tantas mentiras sorridentes, 
crises, jogo de dramas, fracassada
a caminhada enfim chega
sem destino, 
pra calmaria dos trajes 

ultrajando, cansado de tanto
caminhar, bocejar, cantarolar,
esfolar, esfoliar sobre a pele áspera 
dessa cidade invisível, previsível, 
pré-datada 

da janela do carro minha analista 
que chama meu nome estrangeiro, 
nem me vi, nem te fui ver, enfim, 
loura francesa, perdão da pressa
inútil, a sede é que não desce 

é uma mentira desabotoada,
o bar que não me deixa entrar, 
era um filme, uma cena a filmar,
só queria um copo e um cinzeiro
antes que me preguem 

a peça inédita, prestes a começar 
a apanhar da dor, calibrar 
da carteira magra a conta
dois ou três contos 
bem contados

enfim, vai começar
espero que não seja outro 
drama de se deitar na cama
de babar no ombro da menina
é, não temos mais tempo, nem por isso

nem pra matar a última dose 
a breve cena de nudez 
que passou não é mais a minha,
não é da minha 
essa conta seu moço!

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